Confesso que, quando surgiram as primeiras notícias indicando que David Fincher ia realizar um filme sobre a criação do Facebook, fui acometido por uma sensação de receio. Depois do inconsequente "The Curious Case of Benjamin Button", balofo show-off de efeitos digitais, Fincher necessitava de redimir-se, de regressar à atmosfera obsessiva e oprimente que marcou os melhores momentos da sua obra. O ecos vindos da crítica norte-americana, quase unanimemente maravilhada com "The Social Network", e o arraial de nomeações e prémios acumulados até ao momento foram aligeirando o temor. Vãs esperanças...
Mark Zuckerberg é-nos apresentado como um jovem estudante de Harvard que, durante uma birra pueril após ter levado uma tampa duma potencial namorada (mais tarde percebemos que esta mulher será o fulcro da sua obsessão, a primeira verdadeira paixão da sua vida) decide vingar-se e cria uma rede social para a comunidade universitária (inicialmente um esforço jocoso que, eventualmente, será alargado para o público em geral gerando o incontornável Facebook). Fincher tenta filmar esta história como se de uma picaresca epopeia moderna se tratasse, um putativo Don Quijote do século XXI que luta contra os moínhos de vento da inveja e da solidão da sociedade moderna. Ou talvez não.
Aaron Sorkin, argumentista do filme, parece não saber como extrair interesse de uma sequência de eventos desprovidos de qualquer fundo dramático. Gosta claramente de brincar com as palavras e estas são debitadas a um ritmo alucinante pelas personagens. Contudo, a fronteira entre o diálogo perspicaz e a verborreia oca é frequentemente transposta (nem todos podem ser David Mamet). Oscilando entre o slice of life do mundo universitário e o thiller judicial, feito de acareações entre personagens cujas relações foram corroidas pelo sucesso estrondoso e meteórico do Facebook, "The Social Network" apresenta-se como um exercício árido sobre a sociedade contemporânea que, em algum momento, consegue retratar com eficácia a complexidade psicológica dos intervenientes ou o real impacto das consequências das suas acções. Como documento de uma era e de uma revolução social o filme falha rotundamente pela sua frieza e distanciamento em relação às personagens. Como potencial caricatura de uma juventude alienada e cada vez mais solitária (como Zuckerberg) falha ainda mais (é difícil esboçar um sorriso, mesmo que cínico). Por momentos parece que "The Social Network" vai enveredar por uma narrativa à lá "Rashomon", feita de múltiplas verdades ou versões da verdade sobre quem é o real autor do conceito do Facebook. Rapidamente tal ilusão se esvai. Até no capítulo da mise en scéne, em que Fincher não raro foi capaz de surpreender e até inovar, este filme salda-se num profundo fracasso.
Mark Zuckerberg é-nos apresentado como um jovem estudante de Harvard que, durante uma birra pueril após ter levado uma tampa duma potencial namorada (mais tarde percebemos que esta mulher será o fulcro da sua obsessão, a primeira verdadeira paixão da sua vida) decide vingar-se e cria uma rede social para a comunidade universitária (inicialmente um esforço jocoso que, eventualmente, será alargado para o público em geral gerando o incontornável Facebook). Fincher tenta filmar esta história como se de uma picaresca epopeia moderna se tratasse, um putativo Don Quijote do século XXI que luta contra os moínhos de vento da inveja e da solidão da sociedade moderna. Ou talvez não.
Aaron Sorkin, argumentista do filme, parece não saber como extrair interesse de uma sequência de eventos desprovidos de qualquer fundo dramático. Gosta claramente de brincar com as palavras e estas são debitadas a um ritmo alucinante pelas personagens. Contudo, a fronteira entre o diálogo perspicaz e a verborreia oca é frequentemente transposta (nem todos podem ser David Mamet). Oscilando entre o slice of life do mundo universitário e o thiller judicial, feito de acareações entre personagens cujas relações foram corroidas pelo sucesso estrondoso e meteórico do Facebook, "The Social Network" apresenta-se como um exercício árido sobre a sociedade contemporânea que, em algum momento, consegue retratar com eficácia a complexidade psicológica dos intervenientes ou o real impacto das consequências das suas acções. Como documento de uma era e de uma revolução social o filme falha rotundamente pela sua frieza e distanciamento em relação às personagens. Como potencial caricatura de uma juventude alienada e cada vez mais solitária (como Zuckerberg) falha ainda mais (é difícil esboçar um sorriso, mesmo que cínico). Por momentos parece que "The Social Network" vai enveredar por uma narrativa à lá "Rashomon", feita de múltiplas verdades ou versões da verdade sobre quem é o real autor do conceito do Facebook. Rapidamente tal ilusão se esvai. Até no capítulo da mise en scéne, em que Fincher não raro foi capaz de surpreender e até inovar, este filme salda-se num profundo fracasso.
Em que ficamos então? Efabulação sobre uma solidão cibernética? Conto moral sobre como o sucesso financeiro pode destruir a nossa dimensão pessoal e emocional? Sinfonia patética sobre um amor não correspondido? Nada disso. O mais triste é perceber que por detrás da história de Mark Zuckerberg existia um substrato, mesmo que magro, sobre o qual os cineastas poderiam ter construído uma narrativa sólida, feita de personagens com dilemas reais e algum relevo na caracterização emocional. Ficamos com uma mão cheia de nada. O receio que confessei nas primeiras linhas deste texto sai confirmado e ampliado.
Para onde caminha David Fincher como realizador? Neste momento trabalha num remake, aparentemente desnecessário, do sucesso cinematográfico sueco "The Girl with the Dragon Tattoo". O thriller é certamente um território mais familiar, mas será possível superar o factor precocidade na decisão de refilmar uma obra tão recentemente adaptada ao cinema? E que dizer do súbito delírio da crítica com um filme que é tão pouco representativo das qualidades do seu realizador? Fincher pode até ganhar, pela primeira vez, um Óscar por este seu esforço. Não seria a primeira vez que Hollywood premiaria um antigo pária por uma aproximação à banalidade das formas e conteúdos “aprovados” pelo establishment cinematográfico (o exemplo de Martin Scorsese e do seu "The Departed" vem imediatamente à ideia).
Para onde caminha David Fincher como realizador? Neste momento trabalha num remake, aparentemente desnecessário, do sucesso cinematográfico sueco "The Girl with the Dragon Tattoo". O thriller é certamente um território mais familiar, mas será possível superar o factor precocidade na decisão de refilmar uma obra tão recentemente adaptada ao cinema? E que dizer do súbito delírio da crítica com um filme que é tão pouco representativo das qualidades do seu realizador? Fincher pode até ganhar, pela primeira vez, um Óscar por este seu esforço. Não seria a primeira vez que Hollywood premiaria um antigo pária por uma aproximação à banalidade das formas e conteúdos “aprovados” pelo establishment cinematográfico (o exemplo de Martin Scorsese e do seu "The Departed" vem imediatamente à ideia).