Regressa ao grande ecrã com "O Suspeito da Rua Arlington" (Arlington Road, 1999), fabuloso thriller psicológico que, infelizmente, não conquistou grande atenção por parte do público e da crítica, mas que é um dos maiores exemplos do género produzidos na última década. Um professor universitário (Jeff Bridges) retira-se com o seu filho de nove anos num subúrbio de Washington depois da sua mulher, uma agente do FBI, ter morrido durante o cerco à propriedade de um grupo de extrema-direita. Traumatizado com a sua tragédia pessoal, concentra-se nas suas aulas sobre o terrorismo na história americana. Depois de salvar um rapaz que encontra ferido na rua, acaba por criar uma relação de amizade com os pais dele (Tim Robbins e Joan Cusack), que descobre serem seus vizinhos. Conforme ganha confiança com eles, começam a surgir dúvidas sobre a veracidade das suas vidas aparentemente perfeitas. As investigações que faz levam-no a crer que os seus vizinhos podem fazer parte de um grupo extremista que esteve envolvido num devastador ataque à bomba em Saint Louis, numa espiral de obsessão e conspiração que o levarão a um final chocante. O término do filme, pela enorme surpresa que traz, acabou também por ser uma das razões do seu insucesso junto das audiências. Para o nosso mundo pós-11 de Setembro, os temas de “O Suspeito da Rua Arlington” são mais actuais que nunca. Mark Pellington mostra com este filme o seu enorme talento como realizador, exímio na gestão do suspense e na cuidada cadência das revelações surpreendentes que mantêm a narrativa viva. As actuações de Jeff Bridges (perfeito no papel de um homem perturbado) e Tim Robbins (assustador na sua ambivalência) conferem autenticidade ao sentimento de tensão que percorre a história, magistralmente sublinhada pela banda sonora criada a meias pelo experiente Angelo Badalamenti e pelos Tomandandy. Quem conhecer um pouco da história moderna norte-americana, vai certamente notar os paralelos com eventos reais: o incidente de Ruby Ridge, no qual se baseia a morte da mulher de Bridges no filme, e o ataque bombista de Oklahoma, transportado aqui para Saint Louis. A título de curiosidade, refira-se que o genérico do filme foi criado pelo genial Kyle Cooper, responsável por algumas das melhores sequências introdutórias da história recente do cinema (“Seven”, “A Esfera” e o videojogo “Metal Gear Solid 3”, por exemplo).
Trailer do filme "A Profecia das Sombras" (The Mothman Prophecies, 2002).
A sua terceira longa-metragem seria o fenomenal “A Profecia das Sombras “ (The Mothman Prophecies, 2002), inspirado no seminal livro homónimo de John Keel (para mais informações sobre este livro consultem este excelente site, em inglês, criado pelo meu irmão http://bf.web.simplesnet.pt/mothman). Concentrando-se nas histórias pessoais dum grupo restrito de personagens (grande parte dos acontecimentos relatados no livro foram, compreensivelmente, esquecidos) Mark Pellington apresenta aqui o seu melhor trabalho até ao momento, um drama sobrenatural sublime onde as fronteiras da realidade se esbatem e acontecimentos bizarros invadem a existência de pessoas comuns. Este factor realça o impacto emocional de toda a narrativa, explanada num ritmo lento, feito de silêncios incómodos, de uma tensão quase palpável e do confronto eterno, em surdina, entre os terrores da vida e da morte.
Richard Gere (John Klein), numa das suas melhores interpretações de sempre, traz-nos uma personagem emocionalmente ferida após o inesperado falecimento da sua noiva. Nos últimos momentos de vida, deixa-lhe um caderno com misteriosos esboços de uma criatura que viu no momento em que ambos se viram envolvidos num despiste de automóvel. Dois anos depois, o jornal onde trabalha envia-o a Richmond, na Virgínia, para entrevistar um político. Durante a viagem perde-se e vai parar, inexplicavelmente, a Point Pleasant, cidade situada a cinco horas de distância do local onde deveria estar. Depara-se com uma comunidade pacata e aterrorizada por estranhos eventos, desde luzes e chamadas telefónicas estranhas, a avistamentos de uma criatura alada (o “Mothman” do título), que descobre ser semelhante à que a sua noiva desenhou. Depressa percebe que estes eventos paranormais giram em redor de Indrid Cold, uma bizarra figura com aparentes poderes proféticos, cuja aparição está associada a grandes catástrofes vindouras. Obcecado com a busca da verdade, Klein vê-se numa encruzilhada de fantasmas pessoais e acontecimentos sobrenaturais que o parecem perseguir e que culminarão num final dramático. Para criar esta atmosfera oprimente, Pellington preferiu recorrer a poucos efeitos digitais, utilizando a câmara (através de desfocagens), a iluminação (observem-se cuidadosamente as sequências com Gere no quarto de motel) e a montagem como principais armas. Perfeita também a banda sonora dos Tomandandy, um trabalho pleno de originalidade, feito de longínquos uivos e sussurros, pungentes notas de piano e obscuras batidas electrónicas, acompanhadas amiúde pelo dramatismo das cordas. Um conjunto cinematográfico excepcional, num dos grandes exemplos do que o terror contemporâneo pode (e deve) oferecer.
Videoclip de "Everybody's Changing" (2005) dos Keane que acabou por nunca ser oficialmente divulgado ,supostamente pelo grupo achar que não se adaptava à temática da música.
Para o futuro existem já alguns filmes anunciados, como “Henry Poole is Here”, uma comédia negra com Luke Wilson com lançamento planeado para este ano, e ainda “Night and Day You are the One”, thriller sobrenatural sobre um homem que não consegue distinguir os sonhos da realidade depois de assistir a um horrível assassinato. Projectos interessantes para acompanhar a evolução da carreira deste realizador que é já um talento confirmado e cuja obra merece um visionamento cuidado.
Videoclip de "Soul Mate" (2007) de Natasha Bedingfield. Notem-se as
enormes semelhanças estéticas com "A Profecia das Sombras".
1 comentário:
Um nome desconhecido para a maioria, inclusivamente daqueles que se apelidam de cinéfilos. A sua carreira, sendo curta, também demonstra o trabalho de estudo muito profundo que Pellington concede aos seus projectos. O seu talento como realizador está mais que provado, ou não tivesse sido ele o único realizador a demonstrar suficiente paixão e talentos para obter a bênção directa de John Keel para a adaptação da sua obra ao grande ecrã.
The Mothman Prophecies é o paradigma do thriller paranormal da sua década, um exemplo que mais realizadores deveriam seguir.
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